TERCEIRIZAÇÃO, CÂMARA DE GÁS E A MÁQUINA BÍPEDE


A terceirização vem com força. Infelizmente. Passou como trator numa composição da Câmara que, sob a batuta de Eduardo Cunha, podemos agora chamar também de “Câmara de Gás dos Direitos Sociais”. Muito preocupante. A mídia desinforma porque o trabalhador terceirizado ganha menos e precariza as relações de trabalho – o que é vantajoso para as corporações e os grandes detentores do capital.  E a mídia está conseguindo desconstruir o trabalhismo. Ela é a verdadeira “mão invisível” do neoliberalismo, porta-voz dos valores da elite e ilusionista na arte de enganar corações e mentes e a fazer marchar as massas ao abismo. 
A votação avassaladora nesse momento é sintomática: o pragmatismo neoliberal aproveitou a cortina de fumaça da crise política e a desmobilização dos movimentos sociais de base para aprofundar sua pauta e destruir conquistas históricas. O PT – berço do sindicalismo pós-ditadura, diga-se de passagem, colaborou porque cometeu sérias faltas: praticou o mesmo que a elite vinha impunemente fazendo há séculos e que pretende continuar fazendo. Assim, os conservadores e reacionários estão avançando com suas pautas moralista, de ética seletiva e de retirada de direitos sociais dos trabalhadores. A aprovação da terceirização ampliada esta semana na Câmara dos Deputados é um mau sinal disso. Não se enganem, a desagregação dos trabalhadores e a cooptação deles para defesa das pautas da elite está seriamente em andamento. Tem muita gente inocente hasteando e balançando a bandeira alheia com as próprias mãos. 
Segue placar dos votos pela terceirização nas principais siglas da Câmara dos Deputados: 
DEM - 17 de 19; 
PDT - 13 de 18;
PP - 34 de 37;
PSD - 27 de 30;
PC do B - 1 de 13; 
PMDB - 55 de 61; 
PP - 34 de 37;  
PSB - 21 de 30; 
PSDB - 44 de 46; 
PTB - 16 de 22;
PV - 6 de 6;
Solidariedade - 14 de 14; 
PT - 0 de 61;
PSOL - 0 de 5. 
Os deputados alinhados ao neoliberalismo, claro, votaram em peso (aqui). 
Se você não é patrão, é bom saber o que significa isso, porque em um futuro próximo, pelo andar da carruagem, estará enfrentando a precarização das relações de trabalho. A terceirização é a fulanização do trabalhador, é sua despersonalização, passo inicial do processo de desumanização, de transformação do homem no que Emmanuel Seiyès intitulou de “a máquina bípede”.
Mais de duzentos anos de luta postos abaixo de uma tacada só não merece destaque nos jornalões. Muito menos os manifestantes sangrando, agredidos pelos seguranças da Câmara. Maior preocupação e zelo recebeu um dos ratos soltos durante a audiência de uma CPI  que teria ficado ferido e fora “adotado” (aqui). Mas os trabalhadores massacrados continuaram órfãos dos bons olhos da imprensa. Proteger os ratos. Sintomático. Mas por que a grande mídia iria pautar perda de direitos trabalhistas? O Homer Simpson precisa ser (des)informado com coisas mais adequadas entre a novela das sete e a das nove...
Não sou nem um pouco hegeliano: o progresso social não existe. Na vida em sociedade, tudo é construção ou desconstrução. É uma peça sempre em cartaz e na qual nunca devemos nos acomodar como plateia. Somos sempre, também, autores-atores de um roteiro ilimitado. Parafraseando o que na órbita jurídica Dworkin chamaria de uma chain novel, nossa existência em sociedade é um romance em cadeia, no qual cada um de nós ajuda a compor um capítulo  ou deixa alguém compô-lo por si. Se quer deixar nas mãos de outrem, problema seu. Mas lembre-se: o ingresso tem o valor do seu futuro.
Segue sugestão de leitura aos Homo sapiens que ainda restam: 


*Rosivaldo Toscano dos Santos Júnior é juiz de direito e membro da Associação Juízes para a Democracia - AJD.

Comentários

  1. Ótimo artigo! Quero registrar que apenas três partidos orientaram suas bancadas a votar contra este Projeto: o PT, o PCdoB e o PSOL. Ass. Fernando H. Maranhão de Paiva.

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