Visita a uma Vara Criminal em Portugal



Fui a um Tribunal Criminal no Porto, para assistir a audiências criminais. Prédio histórico e amplo, decorado com azulejos portugueses. No seu interior havia um átrio também bem ornado. Dirigi-me a um servidor e questionei sobre a existência de audiências naquela tarde. Ele informou que um julgamento iria acontecer naquele momento e outro logo depois. Perguntou quem eu era. Identifiquei-me e disse tinha interesse em assistir às referidas audiências. Ele então me encaminhou à sala e momentos depois me pediu que o seguisse. Havia dito aos magistrados que eu estava no local. Fui gentilmente recebido pelos três colegas e pelo Representante do Ministério Público, no gabinete de um deles, o colega William Alexander Stuart Themudo Gilman. Conversamos por alguns instantes sobre as peculiaridades dos processos penais de cada país. Logo se iniciaram as audiências. Como se tratavam de casos de julgamento colegiado, dessa vez quem presidiu foi a colega Liliana de Paris Dias.

A magistrada-presidente cordialmente determinou que me fossem entregues cópias das principais peças dos processos da pauta, para que eu melhor pudesse acompanhar os julgamentos. Ótimo.
Em Portugal a Justiça Criminal se reparte, em relação à complexidade da causa, em três ritos. Uma para os crimes menores, até três anos (Tribunal de Pequena Alçada), outra para crimes com penas menores que cinco anos (Juízo Criminal) e outra para os crimes com penas maiores que cinco anos (Vara Criminal). Neste último caso, o julgamento é feito colegiadamente por três juízes. Chamam isso de Vara Criminal. Nos crimes de médio e baixo potencial ofensivo o julgamento é singular.
Em se tratando de crime cuja pena seja igual ou maior que oito anos, que são realizados nas Varas Criminais, o argüido pode solicitar que o julgamento seja pelo tribunal do Júri, composto pelos três juízes togados e por mais quatro leigos, cidadãos da cidade, mais ou menos nos mesmos termos dos jurados brasileiros. A diferença é que nesse caso os juízes togados não apenas presidem o júri, votam também. Resultado é dado pela maioria. A tese que tiver quatro votos é a vencedora.
Voltando à descrição do espaço físico, a sala de audiência é ampla, com pelo menos 70m2, dividida em dois ambientes por uma divisória a meia altura em madeira trabalhada, mais ou menos como as câmaras de um tribunal. Os primeiros bancos da audiência são para as partes e testemunhas. Após um espaço de uns dois metros ficam os bancos para o público, capazes de comportar umas trinta pessoas sentadas.
Em relação às formalidades, todos os magistrados usam togas, bem como o Parquet e os defensores. Quando os magistrados entram, todos se levantam. Á título de curiosidade, nosso CPP determina o mesmo, embora em desuso:
“Art. 793. Nas audiências e nas sessões, os advogados, as partes, os escrivães e os espectadores poderão estar sentados. Todos, porém, se levantarão quando se dirigirem aos juízes ou quando estes se levantarem para qualquer ato do processo.
Parágrafo único. Nos atos da instrução criminal, perante os juízes singulares, os advogados poderão requerer sentados.”
O Membro do MP sentou-se à direita dos juízes, nos mesmos moldes do Brasil. A forma de inquirição é em muito assemelhada ao Brasil. Os depoimentos são gravados e sem degravação, tal qual no Brasil. O sistema de gravação me pareceu bastante robusto. Após as audiências, conversamos mais um pouco sobre nossas Justiças.
Minhas impressões são as de que há uma formalidade maior na condução dos atos processuais, a estrutura física é um pouco superior à encontrada na Justiça Estadual brasileira e compatível com a Federal. O sistema de informática que usam é como o nosso, com atos praticados no sistema mas impressos e inseridos nos autos. Não tive oportunidade para conhecer a escrivania e o fluxo de trabalho, mas teria sido interessante.
Em relação aos crimes, há poucos com violência ou grave ameaça à pessoa. Por se tratar de um Estado em que os Direitos Sociais foram efetivamente implementados, a pobreza e a marginalização são menores e, consequentemente, a criminalização também e as infrações de burla (fraude) são as mais comuns que os roubos e furtos.
Espero que qualquer daqueles colegas possa vir um dia a Natal e conhecer nossa realidade. Seria uma troca de experiências interessante.

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