Trecho que estou inserindo no dispositivo das sentenças em que absolvo por insignificância
DOS EFEITOS
EXTRAPENAIS DA CONDUTA ATÍPICA
A punição penal virou fetiche. O imaginário do senso comum
teórico dos juristas é povoado pela ideia de que a lei penal se transmuda
solução única e em panacéia, mesmo para casos absolutamente desproporcionais à
gravidade e violência da tutela penal. Os efeitos estigmatizantes e deletérios
do sistema penal terminam ocasionado apenas, e tão somente, mais danos,
especialmente em casos como o que ora julgo, em que o crime gera efeitos, e
penalmente insignificantes, somente de natureza patrimonial, para a vítima. O que esta quer é a
rápida reparação do dano, o que, muitas vezes, termina em segundo plano em
razão da priorização da punição penal, com custos financeiros para a sociedade,
além dos contratempos causados à vítima, notadamente pelo tempo perdido nas
audiências e na sua revitimização.
Assim, o fato de se reconhecer a atipicidade da conduta,
entretanto, não quer dizer que com isso ele deixe de ser ilícito. Permanecerá
com a qualidade de conduta desviante, contrária à paz social e à ordem
jurídica. O que se deve mudar é o paradigma de que somente exercendo a tutela
penal o bem jurídico restará protegido. Essa é claramente desprorcional para o caso. Não esqueçamos que existe o direito
civil e a consequente reparação do dano. Ficar inadimplente de um crediário,
por exemplo, não é crime. É mero ilícito civil. E nem por isso todas as pessoas
vivem inadimplentes. Não raras vezes a inserção do nome de quem cometeu um
furto insignificante no SERASA, tem muito mais eficácia. A Parte Geral do CP,
que é de 1940 e sob a tutela de um regime de exceção (ditadura de Vargas), e
ainda aplicada acriticamente, não (re)conhecia isso.
Portanto, nessas pequenas infrações, os atores jurídicos
precisam descobrir outros meios de tutela que não a penal ou a prisão, e
dedicar seu tempo e os recursos insuficientes para o que realmente importa:
crimes que violem de maneira grave os direitos fundamentais.
Nesse mesmo diapasão, diz o art. 186 do Código Civil:
“Art. 186. Aquele que, por ação
ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano
a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.”
Sendo assim, sendo a tutela civil a adequada para o
presente caso, determino que se intime a vítima, enviando os dados pessoais
existentes do acusado, para que ela possa cobrar judicialmente a reparação dos
danos causados pela conduta antissocial. Dê-se ciência à vítima de que o valor
do prejuízo eventualmente sofrido, de ordem patrimonial e moral, poderá ser
cobrado gratuitamente perante o Juizado especial Cível, desde que observado o
limite de 20 salários mínimos, conforme reza a lei 9.099/95 em seu art. 9º:
“Nas causas de valor até vinte
salários mínimos, as partes comparecerão pessoalmente, podendo ser assistidas
por advogado; nas de valor superior, a assistência é obrigatória.”
*Rosivaldo Toscano Jr. é juiz de direito e membro da Associação Juízes para a Democracia - AJD
Caro Dr. Rosivaldo, gostaria de saber se V. Ex. faz a dosimetria da pena na fundamentação ou após o dispositivo, ou ainda, em um tópico apartado entre a fundamentação e o dispositivo???
ResponderExcluirObrigado.
Doutor, "Assim, o fato de se reconhecer a tipicidade da conduta, entretanto, não quer dizer que com isso ele deixe de ser ilícito."
ResponderExcluirParece que está faltando um "não" aí, "não se reconhecer a tipicidade"...
Resposta ao primeiro comentário. Em relação aos fatos, fundamento na parte da "fundamentação". Em relação à aplicação da pena, geralmente no dispositivo.
ResponderExcluirResposta ao segundo comentário. Havia um erro. Consertei. a palavra era, realmente, atipicidade. Muito obrigado.