Advogada da Justiça Global: Presídios nascerão superlotados
Ana Carolina Moreno
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Ela foi uma das três panelistas no evento paralelo que ativistas de direitos humanos realizaram na 13ª sessão do Conselho de Direitos Humanos da ONU, realizado nesta segunda-feira, em Genebra, na Suíça.
Durante duas horas, eles expuseram os vários crimes de tortura cometidos dentro do sistema prisional capixaba a uma comunidade internacional que ficou perplexa.
Leia a entrevista.
Terra Magazine - Como você avalia o resultado do painel?
Tamara Melo - Se a gente pensar pelo que a gente queria com esse evento, ele foi muito bom. Conseguiu dar visibilidade à situação, apresentar as denúncias para o Estado de forma bem clara. Mas foi preocupante porque ficou muito claro que a gente não conseguiu uma resposta do Estado. Diante de tudo o que a gente apresentou, ele não apresentou respostas. Continuou com o mesmo discurso. O diferencial foi que o secretário de Justiça (Ângelo Roncalli) reconheceu as nossas denúncias, a gravidade do que foi anunciado. Ele não analisou denúncia por denúncia, mas foi aceitando o que foi dito. Disse que realmente é a realidade, que é dramático. Isso é diferente de outras situações em que ele negou a existência das denúncias. Mas o que não deu para perceber foi um esforço para mudar a postura.
Como foi a reação da comunidade internacional?
A impressão que eu tive foi que as pessoas ficaram muito impressionadas, a plateia entendeu muito rápido do que a gente estava falando, porque as perguntas que seguiram depois da nossa fala foram bem nos pontos centrais, no debate. Queriam saber sobre a omissão do Estado, o que o Ministério Público pode fazer, quem vai monitorar os presídios para prevenir a tortura. A questão do relacionamento com a sociedade civil também foi citada, porque já fomos proibidos de entrar em unidades prisionais, de registrar o que vimos em fotos e filmes, e quando o painel acabou várias pessoas vieram falar com a gente, sugerindo propostas conjuntas em outras instâncias internacionais. Nossa estratégia de monitoramento continua, até porque o problema não acabou.
Essa foi a primeira vez que o governo do Espírito Santo esteve exposto dessa maneira perante a comunidade internacional?
Não foi. A sociedade civil já vem levando várias denúncias internacionais relativas ao Brasil. Essa não é a primeira nem a última, nem a de maior constrangimento. Foi importante muito mais pela repercussão na imprensa. O tema foi levado em todos os jornais e ganhou visibilidade impressionante, o que é ótimo, porque quando a gente faz uma denúncia internacional é para isso, para levar pra fora e chamar a atenção. O Brasil já foi inclusive condenado em tribunais internacionais. Mas com relação à tortura nada foi dito sobre a responsabilização do governo.
Qual é a solução para o sistema prisional do Espírito Santo?
O governo ainda está centrado à criação de vagas. Quem trabalha com o sistema prisional sabe que isso não resolve o problema. O que a gente vê de forma muito clara é uma política de encarceramento em massa. A superpopulação é um resultado dessa política. Já fica evidente isso porque 70% dos presos são presos provisórios. Isso deveria ser uma exceção, não pode ser regra. Está previsto na Constituição, nos acordos internacionais. Esse é um dos elementos. Também há a questão da pena alternativa. O juiz opta por determinar na sentença final a prisão definitiva, mesmo reconhecendo que há outras opções. Eles determinam penas altíssimas, por muito tempo, sem justificativas. Determinam a prisão em regimes fechados quando poderiam já determinar outros regimes para delitos menos gravosos. O judiciário tem uma grande parcela de culpabilidade na superpopulação. Eles acham que a prisão é solução para todos os males. Assim o Espírito Santo vai virar um grande presídio.
E o Estado não tem nem tempo nem dinheiro para construir tantas vagas, não?
A cada mês ingressam 250 presos no sistema prisional e saem 50. Não é só construindo vagas que a gente vai resolver isso. Mesmo que tivesse agilidade de construir prisões, e ele não tem, é preciso um procedimento administrativo, tempo da obra. Ainda que fosse construída uma a cada mês, não daria conta. O ritmo é muito maior. A expectativa é de que vão construir novas vagas, mas esses novos presídios já vão nascer superlotados. É preciso começar a pensar em alternativas. Não dá pra achar que a superpopulação é resultado do aumento da criminalidade, é em grande medida culpa da postura dos juízes e promotores. Respaldado em grande parte pelos meios de comunicação.
Como os meios de comunicação contribuem com o problema?
Reforçando o argumento do medo e da necessidade da prisão. Vários meios apostam por essa solução. Quem trabalha no sistema prisional tem muito claro que isso não resolve, acho que é preciso levar essa discussão para a mídia. No Espírito Santo, muitas vezes alguns meios não tinham interesse em publicar matérias graves sobre o que estava acontecendo, e esse interesse foi aumentado depois dessa repercussão nacional e internacional. Não estou generalizando porque alguns sempre tiveram.
O jornal A Tribuna, que publicava as colunas do Elio Gaspari, decidiu não publicar justamente o texto dele que falava sobre esse evento na ONU. Qual foi a reação de vocês em Genebra?
Causou muita preocupação para todos nós porque, além de todas as delações que estávamos fazendo, esse caso também colocou em questão a liberdade de imprensa. Isso ficou muito evidente.
Terra Magazine
Especial para Terra Magazine
A advogada da Justiça Global, Tamara Melo, reserva uma previsão pessimista em relação à situação da segurança pública no Espírito Santo, que convive com centros de detenções abarrotados. "A expectativa é de que vão construir novas vagas, mas esses novos presídios já vão nascer superlotados", declarou a Terra Magazine.Veja também:
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Ela foi uma das três panelistas no evento paralelo que ativistas de direitos humanos realizaram na 13ª sessão do Conselho de Direitos Humanos da ONU, realizado nesta segunda-feira, em Genebra, na Suíça.
Durante duas horas, eles expuseram os vários crimes de tortura cometidos dentro do sistema prisional capixaba a uma comunidade internacional que ficou perplexa.
Leia a entrevista.
Terra Magazine - Como você avalia o resultado do painel?
Tamara Melo - Se a gente pensar pelo que a gente queria com esse evento, ele foi muito bom. Conseguiu dar visibilidade à situação, apresentar as denúncias para o Estado de forma bem clara. Mas foi preocupante porque ficou muito claro que a gente não conseguiu uma resposta do Estado. Diante de tudo o que a gente apresentou, ele não apresentou respostas. Continuou com o mesmo discurso. O diferencial foi que o secretário de Justiça (Ângelo Roncalli) reconheceu as nossas denúncias, a gravidade do que foi anunciado. Ele não analisou denúncia por denúncia, mas foi aceitando o que foi dito. Disse que realmente é a realidade, que é dramático. Isso é diferente de outras situações em que ele negou a existência das denúncias. Mas o que não deu para perceber foi um esforço para mudar a postura.
Como foi a reação da comunidade internacional?
A impressão que eu tive foi que as pessoas ficaram muito impressionadas, a plateia entendeu muito rápido do que a gente estava falando, porque as perguntas que seguiram depois da nossa fala foram bem nos pontos centrais, no debate. Queriam saber sobre a omissão do Estado, o que o Ministério Público pode fazer, quem vai monitorar os presídios para prevenir a tortura. A questão do relacionamento com a sociedade civil também foi citada, porque já fomos proibidos de entrar em unidades prisionais, de registrar o que vimos em fotos e filmes, e quando o painel acabou várias pessoas vieram falar com a gente, sugerindo propostas conjuntas em outras instâncias internacionais. Nossa estratégia de monitoramento continua, até porque o problema não acabou.
Essa foi a primeira vez que o governo do Espírito Santo esteve exposto dessa maneira perante a comunidade internacional?
Não foi. A sociedade civil já vem levando várias denúncias internacionais relativas ao Brasil. Essa não é a primeira nem a última, nem a de maior constrangimento. Foi importante muito mais pela repercussão na imprensa. O tema foi levado em todos os jornais e ganhou visibilidade impressionante, o que é ótimo, porque quando a gente faz uma denúncia internacional é para isso, para levar pra fora e chamar a atenção. O Brasil já foi inclusive condenado em tribunais internacionais. Mas com relação à tortura nada foi dito sobre a responsabilização do governo.
Qual é a solução para o sistema prisional do Espírito Santo?
O governo ainda está centrado à criação de vagas. Quem trabalha com o sistema prisional sabe que isso não resolve o problema. O que a gente vê de forma muito clara é uma política de encarceramento em massa. A superpopulação é um resultado dessa política. Já fica evidente isso porque 70% dos presos são presos provisórios. Isso deveria ser uma exceção, não pode ser regra. Está previsto na Constituição, nos acordos internacionais. Esse é um dos elementos. Também há a questão da pena alternativa. O juiz opta por determinar na sentença final a prisão definitiva, mesmo reconhecendo que há outras opções. Eles determinam penas altíssimas, por muito tempo, sem justificativas. Determinam a prisão em regimes fechados quando poderiam já determinar outros regimes para delitos menos gravosos. O judiciário tem uma grande parcela de culpabilidade na superpopulação. Eles acham que a prisão é solução para todos os males. Assim o Espírito Santo vai virar um grande presídio.
E o Estado não tem nem tempo nem dinheiro para construir tantas vagas, não?
A cada mês ingressam 250 presos no sistema prisional e saem 50. Não é só construindo vagas que a gente vai resolver isso. Mesmo que tivesse agilidade de construir prisões, e ele não tem, é preciso um procedimento administrativo, tempo da obra. Ainda que fosse construída uma a cada mês, não daria conta. O ritmo é muito maior. A expectativa é de que vão construir novas vagas, mas esses novos presídios já vão nascer superlotados. É preciso começar a pensar em alternativas. Não dá pra achar que a superpopulação é resultado do aumento da criminalidade, é em grande medida culpa da postura dos juízes e promotores. Respaldado em grande parte pelos meios de comunicação.
Como os meios de comunicação contribuem com o problema?
Reforçando o argumento do medo e da necessidade da prisão. Vários meios apostam por essa solução. Quem trabalha no sistema prisional tem muito claro que isso não resolve, acho que é preciso levar essa discussão para a mídia. No Espírito Santo, muitas vezes alguns meios não tinham interesse em publicar matérias graves sobre o que estava acontecendo, e esse interesse foi aumentado depois dessa repercussão nacional e internacional. Não estou generalizando porque alguns sempre tiveram.
O jornal A Tribuna, que publicava as colunas do Elio Gaspari, decidiu não publicar justamente o texto dele que falava sobre esse evento na ONU. Qual foi a reação de vocês em Genebra?
Causou muita preocupação para todos nós porque, além de todas as delações que estávamos fazendo, esse caso também colocou em questão a liberdade de imprensa. Isso ficou muito evidente.
Terra Magazine
Caro Dr. Rosivaldo, Indiquei o blog do senhor na seção "territorialidades" do "A navalha de Dalí". Parabéns pelos escritos, e um grande abraço. Murilo.
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